QUINTA-FEIRA, 7 DE NOVEMBRO

A eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, com muito mais força popular, pela lavada de votos que deu nos democratas, mais experiência – é o mais velho a ocupar a Casa Branca - e força nas duas Casas do Congresso e também no Judiciário, apontam para uma nova Era naquele país, hoje acossado por problemas externos e internos. Alguns falam até na barbárie que lá se anuncia diante do comando de homem inequivocamente truculento que se guia pela cartilha que aprendeu com Roy Cohn - https://brasil.elpais.com/cultura/2020-06-22/a-obscura-vida-do-homem-que-apadrinhou-donald-trump.html -, o ”advogado mais duro, cruel, leal, vil e brilhante da América”, seu mentor. Ele lhe ensinou as regras contemporâneas para vencer numa ordem social extremamente competitiva onde o maior insulto que se faz a uma pessoa é chamá-lo “looser” (perdidor): 1) Ataque sempre; 2)Jamais admita que perdeu ou errou; 3) Seja implacável. Cinismo absoluto. Uma versão perversa do “Manual da Mundanidade” de Baltazar Gracián, monge espanhol do renascimento, que acabou estigmatizado pelo estilo pouco edificante da obra. Some-se a isso as ideias de Trump, já assumidas por ele em outros tempos, de simpatia por Hitler. Não por acaso, seu Chefe de Gabinete, General John Kelly, o classificou, recentemente, como “fascista” - https://oglobo.globo.com/mundo/noticia/2024/10/23/eleicoes-nos-eua-ex-chefe-de-gabinete-de-trump-diz-que-ele-se-enquadra-na-definicao-de-fascista-e-prefere-abordagem-de-ditador.ghtml . Aliás, o primeiro chefe de Estado a cumprimentar Trump foi justamente o ultradireitista Presidente de El Salvador, Nayib Bukele, igualmente consagrado nas urnas, seguido por Milei, Netanyahy e...o ex Bolsonaro... Serão, portanto, tempos sombrios no grande país do norte. Um novo Manifesto bem poderia se iniciar, hoje, com estas palavras: “Um fantasma ronda o mundo: o fantasma da ultradireita”.

Será, então, que, como diz o provérbio A VOZ DO POVO É A VOZ DE DEUS, este é o caminho sagrado da salvação da humanidade?

Aqui vale a pena lembrar que outrora, outros líderes cruéis também ascenderam ao Poder por via “democrática”. Hitler não deu nenhum golpe para chegar à chancelaria alemã em 1933. Foi convidado pelo Presidente da República, sob o conselho de outro líder de direita, Von Pappen, indicado para vice de Hitler, que via na manobra um meio para chegar ao Poder. Em seis meses, a República de Weimar caía sob o regime ditatorial dos nazistas. Em 1922 não foi muito diferente a ascensão de Mussolini ao Poder na Itália. Voltando mais atrás ainda: Não foi o povo de Atenas que condenou Sócrates à cicuta? E não foi Cristo condenado à cruz pelo seu próprio povo judeu, enquanto Pilates, autoridade romana em Jerusalém, lavava suas mãos?

Diz-se que Deus escreve certo por linhas tortas? Será que o povo não escreve errado, muitas vezes, nas quatro linhas na Constituição?

Bernard Shaw, grande e consagrado intelectual do século XX, severo crítico dos Estados Unidos, já dizia que aquele país havia saído da barbárie à decadência sem ter passado pela civilização. Exagero. Há, sim, uma civilização na literatura, na música, no Cinema, na Ciência, por trás do “american way of live”. Mas já no final do século passado um historiador atento, Tony Judit, chamava a atenção para o declínio do liberalismo subjacente á esta civilidade, fosse na imprensa, fosse na vida pública, mesmo que segmentos progressistas de esquerda ainda estivessem presentes na Academia, bem representada nestas eleições por KAMALA. E o povo...?

Agora, porém, o cenário é mais complexo, pelas mudanças no cenário internacional. A China ameaça, realmente, o poderio americano e se tem mostrado eficiente na articulação dos anseios desenvolvimentistas do Sul Global, hoje articulado em torno do BRICS. Trump não dará trégua á guerra comercial contra a China e já avisou que vai taxar seus produtos em 60%, com o que provocará um colapso no comercio mundial. Tentará, atendendo recomendação remota de Kissinger, afastar a Rússia da aliança com os chineses, na esperança de reeditar em outros moldes a Teoria do Elo Mais Franco, do ex Secretário de Estado Brzezinski, nos anos 1970 e que levou ao fim da URSS a partir da Polonia. Trump apostará na Rússia.

E o resto? O resto são reflexões sobre o que virá a reboque desta decisão de política externa: Mais inflação e desemprego. Lá e cá. Paradoxalmente, o que levou Trump ao Poder novamente, a economia, poderá desgastá-lo. Mas aí quem vai tirar o guizo do gato...?

BARBÁRIE OU CIVILIZAÇÃO?